Colunista Moacir Saraiva: “Agoniar e desagoniar”

Foto: Reprodução

A longevidade vai nos limitando e em algumas situações ela põe nos nossos ombros enfermidades mais limitantes, seja a própria longevidade como as enfermidades deveriam ser um gatilho para termos sede de viver com mais tranquilidade, com menos picuinhas, e sermos agentes da alegria e da sabedoria.

            Tanto na mocidade como com o passar dos anos, algumas pessoas têm dificuldade em enxergar o outro, mesmo morando junto, mesmo sendo parceiros de longas datas, esse enxergar é ver a dor daquele que convive com você, é ver a sua alegria, é ver o seu sucesso e suas limitações. Na convivência diária, muitos vão se incapacitando de ver a luz do parceiro, uma vez que ele quer que sua luz seja a única das relações e para isso o outro tem de estar a serviço dele.

            Em virtude desse sentimento no qual cada um se indisponibiliza se fechando em si mesmo, surgem arranhuras e picuinhas que farão parte da vida do casal, em uns relacionamentos com mais frequência do que em outros. Quando isso não destrói o casamento, destrói a relação e a convivência é apenas para cumprir a burocracia.

            É bom dizer que isso nasce de futricas pequenas, bem pequenas e se não ajustadas no nascedouro, crescem se reproduzem e congelam a relação do casal, tornando infeliz a vida de cada um e essa rancorosidade se estende para filhos, amigos e parentes.

            Um casal de amigos, já com dez anos vivendo juntos estabeleceu uma regra básica para eles se contemplaremtodos os dias, não só enxergar, mas ver o outro por inteiro, vendo as tristezas, as alegrias, as preocupações enfim, estar disponível para acolher o parceiro, sobretudo naqueles dias nos quais não se está bem, pois ter altos e baixos é da natureza humana.

            A esposa foi quem começou esse movimento dentro de casa, o marido o adotou e hoje dão risadas quando o sinal é dado de que algo precisa ser enfrentado pelos dois. No início da relação, quando o marido levantava agoniado, diferente dos dias anteriores, ou chegava em casa emburrado, ela percebia, sorria e falava para ele, olhando-o nos olhos e fazendo um gesto:

            – Você tem dois trabalhos, um para agoniar e o segundo para desagoniar.

            Junto com a fala ela suspendia a mão e fazia o V da vitória com os dedos médio e indicador.

            Com essa fala e esse gesto simples, desarmava o sujeito, ele sorria e a abraçava. Ele aprendeu e faz o mesmo com ela. Hoje, não é necessário nem o discurso, basta levantar a mão com os dedos formando o V.

            Esse casal leva a vida com muita leveza, pois um se preocupa efetivamente com o outro e outro com o um.

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