Colunista Moacir Saraiva: “A ciumenta”

         Há quem diga que o ciúme é fruto do amor, mas as suas consequências contradizem essa assertiva, pois esse sentimento traz desconfianças, brigas que, infelizmente, desgastam a relação, ao extremo chega até a morte, certamente o amor não tem nenhuma culpa das pessoas se inflarem de venenões com o codinome de ciúme.

         Não é fácil encontrar casais em que um dos parceiros ou os dois não carreguem consigo essa desventura e argumentam que quem ama de verdade nunca tem tranquilidade, quando está perto tem ciúmes, quando se distancia o caboco ou a caboca fica troncho de saudades. É uma inquietude perene. Esse argumento se esvai porque tal infortúnio só se vê nas gentes mais novas. A idade traz maturidade e muito respeito, em que a maioria não faz declarações estrondosas de amor, mas tem um zelo estrondoso com o(a) companheiro(a) nos detalhes do cotidiano.

         Mas o mundo está aí para destronar conceitos, anuviando certezas pétreas. Conheço um casal, não de idosos, mas bem maduros, com dois netos e esporadicamente a erva daninha do ciúme emerge, não por motivos conhecidos, o pretextoque faz irromper da alma da jovem senhora esse sentimento peçonhento é algo risível, mas a deixa sisuda e o riso toma conta do marido e dos amigos que estão, às vezes, na casa do casal, bebericando uma cervejinha e degustando um churrasco.

         Umaatmosfera dessa, tem de ser acompanhada por uma boa música e cada grupo carrega suas “boas músicas”, esse grupo, já a maioria com muitos carnavais no lombo, preferia músicas da jovem guarda e quando se encontrava, nessas circunstâncias, a playlist já estava selecionada e mais de um dos membros do grupo tinha a sua. Nesse dia, era o aniversário do moço, cuja esposa, às vezes, manifestava ciúme. Os companheiros já sabiam o que motivava o destempero da jovem senhora. Alguém colocou a música A Desconhecida, lançada em 1973, por Fernando Mendes. Uma das estrofes diz o seguinte:

Depois de tudo que ouvi /Não consigo esquecer
Ela me disse adeus e se foi / Nem seu nome eu sei dizer

         A esposa enfezou e nada disse, mas os companheiros já sabiam a razão de ela mudar o semblante, não demorou muito, ela, cuspindo veneno pelas ventas, se dirigiu ao esposo e perguntou:

         – Quem é essa que você nunca esquece?

         A risada foi geral, o esposo não podia ouvir essas músicas que a esposa invocava e dizia que cada música era uma amante dele do passado e ela queria saber quem era.

         Depois dessa música, os amigos, para pirraçarem mais ainda, colocaram Amada Amante de Roberto Carlos de 1971, e na parte da música que diz:

Que flutua no meu leito / Que explode no meu peito / E supera o que já fez.

         A esposa perdeu as estribeiras e acintosamente, perguntou ao marido:

         – Quem essa vagabunda?

         Acho que nenhum leitor, já tinha vistoo ciúme arrebentando a alma a partir de músicas do passado.

         Vivendo e aprendendo.

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