Os segredos para conseguir cumprir as resoluções de Ano Novo

por BBC

Quase todos os anos, desde que me tornei adulto, comecei o Ano Novo determinado a cumprir uma série de resoluções. Como é previsível, os resultados têm sido irregulares.

Em 2021, basicamente cumpri meu objetivo de fazer uma sessão diária de 20 minutos de treinamento de alta intensidade, mas fracassei completamente com meu objetivo de sair das redes sociais.

Segundo meus relatórios semanais de tempo gasto na frente das telas, ainda passo duas a três horas por dia com meu telefone celular, lendo más notícias em grande parte do tempo.

Estou longe de estar sozinho na minha determinação de iniciar cada novo ano com um plano de autoaprimoramento.

Pelo menos um quarto das pessoas faz pelo menos uma resolução de Ano Novo e grande parte dessas boas intenções termina em decepção.

Para quem não segue essa tradição, o próprio ato de criar uma resolução de Ano Novo pode parecer ilógico.

Racionalmente falando, o dia 1° de janeiro não deveria ser melhor que nenhum outro dia do ano para fazer uma mudança de vida.

Qual seria então o motivo dessa pressão desnecessária para aprimorar a nossa vida sempre que abrimos um novo calendário?

Pesquisas psicológicas recentes indicam que existem muitas razões para aproveitar o primeiro dia do Ano Novo para começar um novo regime, por exemplo. E, ao compreender e fazer uso desses mecanismos, é possível aumentar as possibilidades de cumprir com nossos objetivos para 2022.

O efeito do novo começo

É difícil definir exatamente quando começou a nossa tradição de fazer resoluções de Ano Novo.

Anna Katharina Schaffner, historiadora cultural e autora do livro The Art of Self-Improvement (“A Arte da Automelhoria”, em tradução livre), indica referências literárias sobre a automelhoria que remontam a séculos atrás – até à China antiga e aos estoicos romanos, por exemplo.

A prática de estabelecer objetivos em uma data específica do calendário já era comum nos anos 1860, como se pode ver em uma das cartas de Mark Twain.

“Ontem, todos fumaram seu último charuto, tomaram sua última bebida e fizeram seu último juramento”, escreveu Twain em 1° de janeiro de 1863.

“Hoje, somos uma comunidade piedosa e exemplar. Daqui a 30 dias, teremos abandonado nossa reforma aos ventos e saído para retomar nossas antigas imperfeições muito mais cedo que das outras vezes. Também relembraremos alegremente como fizemos o mesmo na mesma época, no ano passado”, acrescentou.

Na opinião de Schaffner, não é coincidência que muitos de nós sejamos tão propensos a fazer mudanças positivas após um prazeroso final de ano.

“Nós nos permitimos muitas coisas e agora é o momento da purificação”, afirma ela, acrescentando que é significativo que muitas resoluções concentrem-se na abstinência – abandonar maus hábitos para limpar o nosso corpo e a nossa alma.

O “princípio da purificação” não consegue explicar totalmente a nossa inclinação para resoluções de Ano Novo.

Afinal, muitos de nós podemos fazer promessas após ter festividades relativamente sóbrias. E muitos dos nossos objetivos são relacionados ao trabalho ou buscas pessoais que nada têm a ver com expiações físicas ou espirituais.

Existe então alguma coisa especial sobre essa data que motive qualquer tipo de mudança pessoal? Podemos encontrar algumas indicações na forma em que o cérebro organiza suas memórias.

Os psicólogos descobriram que, em vez de observar nossa vida como algo contínuo, nós tendemos a elaborar uma narrativa dividida em “capítulos” separados que marcam as diferentes etapas da vida.

Esses capítulos podem caracterizar eventos importantes da vida, como entrar na universidade, casar-se ou o nascimento do seu primeiro filho.

Mas a nossa mente sempre pode dividir esses capítulos importantes em seções menores, de forma que a entrada de um novo ano pode representar uma interrupção da narrativa.

“As pessoas tendem a pensar na própria vida como se fossem personagens de um livro”, segundo Katy Milkman, professora de psicologia da Escola Wharton da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, e autora do livro How to Change (“Como Mudar”, em tradução livre).

“Sempre que você tem um momento que parece ser um marco divisório de tempo, a sua mente cria a sensação de que você começou de novo”, afirma Milkman. “Você está virando a página e surge uma folha em branco, é um novo começo.”

Isso ajuda a criar distância psicológica dos fracassos do passado, segundo ela, fazendo com que você sinta que eventuais erros são o “antigo você” e agora você fará melhor.

Em 1° de janeiro, posso achar que todo o tempo que perdi no Twitter era o “David de 2021”, mas o “David de 2022” terá o foco e a dedicação de Zadie Smith – autora, entre outros, do livro O Caçador de Autógrafos -, que se afasta, de alguma forma, das redes sociais (e, na verdade, de qualquer distração online) para escrever seus best-sellers.

Milkman trabalhou com Jason Riis, da Universidade Harvard, e sua aluna de doutorado Hengchen Dai, hoje professora da Faculdade de Administração da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) – ambas nos Estados Unidos – para investigar o “efeito do novo começo” em diversos ambientes.

Em um estudo, eles analisaram dados do stickK, um aplicativo e website popular de definição de objetivos, destinado a ajudar as pessoas em seu autodesenvolvimento.

Dai e Milkman concluíram que as pessoas não são propensas a definir novos objetivos apenas no Ano Novo – como seria esperado – mas também depois de qualquer período de férias.

Elas encontraram até uma leve aceleração às segundas-feiras, com as pessoas tentando reiniciar com a nova semana, e no primeiro dia de cada mês.

Para obter mais evidências, Milkman, Riis e Dai testaram se poderiam provocar artificialmente o efeito de novo começo.

Para isso, os pesquisadores primeiramente convidaram os participantes a inscrever-se para receber um lembrete dos seus objetivos por e-mail – com diferenças sutis na forma de mencionar a data.

Considere, por exemplo, um lembrete enviado em 20 de março. Para alguns alunos, a data era marcada simplesmente como “a terceira quinta-feira de março” – o que dificilmente seria um marco temporal significativo. Para outros, a referência dizia “o primeiro dia da primavera” – que supostamente provocaria uma sensação de novo começo.

A estratégia funcionou conforme o esperado. Os alunos que haviam sido incentivados a pensar em um “novo começo”, com base em uma marca temporal, foram mais propensos a iniciar um novo hábito de ginástica, melhorar a higiene do sono ou passar menos tempo nas redes sociais, em comparação com aqueles que não haviam sido levados a considerar a data como uma divisão clara e significativa da linha do tempo.

Naturalmente, o Ano Novo é um ponto de partida muito atraente, em comparação com outros eventos. “É uma grande quebra de capítulo para a maioria das pessoas”, afirma Milkman.

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