Colunista Moacir Saraiva: “Seu corno, tire a porca da história”

 

Eram três irmãos e duas meninas, todos adultos, o pai, um agricultor e na região era tido como rico, pois possuía um veículo, na época, um dos mais requisitados, um Fuscão Preto, que se notabilizou em virtude da música cantada por Almir Rogério, na década de 80, com esse nome.

O velho tinha um ciúme danado do seu possante, lavava todos os dias, passava cera para o bicho brilhar, saia muito pouco e dos filhos só confiava em um para conduzir o Fuscão Preto. O motivo dessa confiança não se sabe exatamente, talvez pelo fato de os outros beberem e o escolhido ser abstêmio.

Mesmo confiando, o rapaz só conduzia a máquina em momentos importantes, segundo a ótica do pai e não adiantava o rapaz argumentar, pois só quando o velho elencava como um motivo nobre é que liberava a chave.

Um dia, chegou um sobrinho estudante de medicina da capital e o velho achou muito importante a chegada do “médico” e liberou o veículo para os filhos fazerem essa visita, mas só foram dois irmãos e mais quatro primos, naquela época não se respeitava a quantidade de passageiros e já que o bicho era possante, vamos lotá-lo, todo mundo espremido, mas tudo era motivo de festa, ainda mais para o ver o primo doutor.

Saíram por volta das 19 horas e o pai recomendou que não demorassem, segundo ele, a noite foi feita pra dormir e não pra fazer farra. Lá, a cachaça rolou e o filho predileto sem beber nada e querendo vir embora, por conta do avanço da noite que, nesses momentos de alegria, anda a galope. No entanto, a prosa tava boa, o primo médico impressionando a todos com sua falação bonita, além do mais, eram oferecidas bebidas diferentes e boas trazidas pelo primo e muita comida que os primos mal conheciam. Então, com esse tripé de novidades ninguém se afasta, mesmo havendo vozes contrárias à permanência.

Retornaram duas horas da madrugada, todos bêbados, exceto o motorista. A estrada de barro bem conhecida pelo condutor do veículo, mas ele apertou mais o pé no acelerador a fim de apressar a chegada em casa. Como nesse caso e em outros, chegar em casa um minuto atrasado ou horas, a briga é a mesma. Não adianta correr.

Em uma curva acentuada, o motorista saiu um pouco da estrada e arranhou, em umas árvores, o lado dos passageiros, e os galhos das árvores, indignados por terem sido acordados abruptamente, se vingaram e arranharam com gosto o carro, ficando toda a lateral com marcas.

Os festeiros chegaram em casa e foram dormir, todos no mesmo quarto, apenas um não dormiu, o motorista que foi matutar que justificativa daria para a briga ser menor e não ser impedido definitivamente de conduzir o Fuscão Preto.

A reza diária do pai, ao levantar, era ir olhar o seu veículo, para saber se estava no lugar e olhava o bicho todo para ver se havia algum estrago, nesse dia ficou assustado com o que vira, não só assustado, mais enraivecido e saiu num rompante rumo ao quarto onde o predileto e os demais passageiros dormiam.

Abriu a porta com a elegância de quem está enfurecido e esbravejou:

– Seu corno o que houve com o meu Fuscão Preto?

O rapaz se cobria com um lençol e com a voz trêmula, respondeu:

– Papai, eu vinha na estrada e uma porca com os leitões entraram na frente do carro e tive de desviar.

Retrucou o pai, com  mais raiva ainda.

– Tire a porca da história, seu corno, onde já se viu porco andar de madrugada em estrada?

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Close