Colunista Moacir Saraiva: “Missão dada, missão cumprida”
No último fim de semana, precisamente no sábado, 15/02, tive de cumprir uma missão não muito agradável, mas não me restou outra alternativa.
Partiu para o outro lado da vida, a amiga Edna Xavier, aos 76 anos, a conheci em 1995, e sempre a vi como um ser humano alegre, astral alto e nada, nada tirava sua alegria e seu sorriso cativante. Outro traço marcante era a forma como se dirigia aos seus interlocutores, sua fala vinha de suas entranhas, vinha de sua alma, vinha de todo seu corpo, ela jogava toda a sua energia, ao nos chamar de abençoado ou abençoada.
Acho que ao usar essas expressões, o tom que utilizava, o olhar que dirigia, o sorriso que as acompanhava, deixava o interlocutor sem nenhuma força para lhe dizer não. Sua psicologia do convencimento era fatal, para negá-la um pedido, o sujeito ficava desarrumado e só se utilizava da negativa quando nada podia ser feito para atendê-la.
Cajaibana, professora e não nasceu em berço de ouro, mas teve uma trajetória gigante conquistando não ouro para ela, não riquezas, mas conquistando espaços para sua gente, para seu povo, espaços para os pobres, conquistando espaços para o crescimento dos outros, e bastante gente lhe é grata, pois muitos cresceram através de seus empurrões, empurrões calcados no amor e no incentivo e, muitas vezes, até empurrões financeiros, onde tirava dinheiro de sua família para favorecer o crescimento de desconhecidos.
Quem cuida de si, cuida dos outros, e ela adotava essa filosofia de vida, pois estava sempre elegante, sempre bem vestida, sempre maquiada, sempre de cabeça erguida, sempre com palavras entusiastas, sempre se cuidando em todos os seus aspectos, nem mesmo uma enfermidade grave a abateu, verdade que a deixou com sequelas, no entanto com sua fome de viver intensamente ela soube conviver com o AVC sem maiores prejuízos para o seu agir na sociedade, não podia mais escrever com a mão direita ela aprendeu a usar a outra mão para a escrita. São esses detalhes que engrandecem um ser humano, são esses detalhes que mostram para que o ser humano veio a terra.
Ela me deu uma missão e a cumpri. Nos velórios de amigos comuns, em Valença, muitas vezes ficávamos juntos e conversávamos, dávamos risadas, pois as resenhas de velórios são fantásticas. Antes da pandemia, em Valença, o féretro saia carregado pelas ruas até o cemitério, no entanto, na praça da Triana, muita gente deixava de seguir o defunto, por vários motivos, inclusive a própria ladeira Conselheiro Franco que é bastante longa,se torna um dificultador, pois aqueles que já estão próximos de serem os passageiros dos caixões não têm tanta saúde para enfrentá-la.
E em dois ou três desses cortejos, eu ia conversando com a amiga Edna Xavier, e ao chegar à Triana, eu faleique teria alguns compromissos e precisava voltar. Ela, mesmo com suas limitações, ia até o topo da caminhada deixando o falecido na sua casa definitiva.
Antes de nos despedirmos, ela me olhava e dizia com um sorriso bem aberto e com uma energia que lhe era peculiar:
– Abençoado, no dia do meu cortejo não me abandone na metade do caminho, me leve até o fim.
Fui até o cemitério de Cajaíba a fim de cumprir uma missão que me foi dada.