Atenção Básica à beira do colapso

Longe de posições ideológicas, a observada deserção de médicos brasileiros que vieram substituir o Programa Mais Médicos (PMM) já estava anunciada.

No fim do ano passado, 8.517 médicos cubanos deixaram o programa, e o Governo Federal havia informado que todas as vagas haviam sido preenchidas por médicos brasileiros.

A verdade é que todos os estudos de fixação profissional já corroboravam essa dinâmica de abandono, inclusive o recente estudo do Conselho Federal de Medicina, Demografia Médica do Brasil – 2018, onde 80% dos médicos recém-formados (perfil do grupo desertor) desejavam ingressar em algum programa de residência médica e apenas 5% queriam ir para programas vinculados à Atenção Básica.

É comum que boa parte dos médicos queira atuar em centros especializados e grandes hospitais, até porque o curso de Medicina ainda é muito elitista. A prática confirmou o que já vinha sendo observado há cinco anos, uma elevada adesão inicial de médicos brasileiros na reta final da faculdade, cujos planos de curto prazo eram outros: cursar residência ou se especializar.

Para além disso, é sabido, que os médicos intercambistas atuavam em localidades pouco estruturadas e muitas delas inóspitas, onde nem um médico brasileiro queria ir. E este é outro fator para que em pouco tempo caíssem na realidade.

Não bastando os 1.052 médicos que já desistiram, 40% da perda está concentrada no Nordeste, sobretudo na Bahia. Devemos ainda lembrar que muitos dos médicos que permanecem no programa, migraram de municípios com menor infraestrutura, onde ocupavam vagas por contrato direto municipal, para outros com melhores condições, dentro do programa federal. Essa situação aconteceu em quase 50% das vagas dos últimos editais, conforme levantamento da Diretoria da Atenção Básica do Estado da Bahia, ratificado pelo estudo do CONASEMS e determinou um perverso desequilíbrio, ao esvaziar regiões e localidades mais carentes e acentuar suas assimetrias. Se a situação não era boa, agora está pior.

Por sua vez, o Ministério da Saúde, em seu último edital de renovação de bolsa dos médicos que atuam no PMM, excluiu os Municípios das regiões Metropolitanas e as Capitais. Com isso, a nossa sofrida Atenção Básica de Salvador já perdeu 38 médicos e perderá os outros 102 médicos em pouco tempo.

O reflexo da desestruturação por que passam os municípios já pode ser sentido nos números da central de regulação: aumento de 40% na demanda por internações hospitalares ao longo dos últimos três meses.

As cartas estão na mesa, o jogo está sendo jogado e os únicos que já estão perdendo são os usuários do SUS, que não encontram mais médicos em boa parte das Unidades de Salvador e dos municípios mais carentes da Bahia.

Fábio Vilas-Boas
Secretário da Saúde da Bahia

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