Colunista Moacir Saraiva: “Na pandemia, roupa nova!”

 

A pandemia mudou hábitos de todos, pois não é possível manter o mesmo estilo de vida sem poder pôr a cara na rua, e o tempo se arrastando lentamente como o andar do bicho preguiça, o dia demora uma eternidade, no início seria apenas uma quarentena, chegamos à sessentena, à setentena e já atingimos mais de cem dias e nenhuma luz indicando o reinicio de uma nova vida.

O casal se adaptou a essa novidade, no apartamento, além deles, dois filhos, os meninos voltaram para o lar, no início do surto do coronavírus a fim de fazer companhia aos pais. Nos primeiros dias, novidades com muitos filmes, séries e havia desafio para cada dia um apresentar um texto interessante a fim de lê-lo e colocar em discussão. Os filmes também eram discutidos, enfim um clima cultural fantástico. Essas atividades culturais são mais constantes com os pais, pois os filhos, mesmo estando em casa, tinham de trabalhar.

As noites preenchidas com jogos de cartas, com campeonatos em que os idosos, quase sempre, levavam vantagens, ao mudarem para o dominó aí os novos davam de goleada. Jogavam também o scrabble, é um jogo em que cada um tem de formar palavras a partir de letras tiradas de um saco, é interessante, e nesse, a disputa era fantástica e ganha quem tem um vocabulário mais rico.

As tarefas domésticas são divididas de modo que nenhum fique encostado e nem sobrecarregado, respeitando o horário de trabalho dos filhos, observando também a força física dos mais jovens, a estes eram atribuídas as tarefas que exigiam maior vigor e o apartamento permanece limpo, agradável, organizado e o mais importante, há uma atmosfera muito boa. A cozinha é mais frequentada pelos pais, pois estes gostam mais dessa atividade e os dois têm as mãos divinas para prepararem o alimento.

Um outro aspecto interessante provocado pela COVID-19 é a forma de nos vestirmos, por estarmos permanentemente dentro de casa, só usamos roupas caseiras, os homens usam calção com camisa e uma sandália, entra dia e sai dia e o guarda-roupa fica praticamente fechado, pois duas ou três mudas de roupas são suficientes para nos vestir até um século, desde que não saiamos de casa, como a situação atual. Além da vestimenta, alguns negligenciam o visual, corte de cabelo, nesse item tanto homens como mulheres são afetados, um outro tópico significativo é a pintura do cabelo, e nesse, a mulher é mais prejudicada, uma vez que é quem mais precisa e não têm a quem recorrer, muitas fazem a própria pintura, isso dá para maquiar um pouco.

Uma segunda-feira do mês de julho, estavam os filhos e a mãe, à mesa, tomando café, cedo, pois não conseguiam permanecer na cama até tarde, além de os jovens começarem a cumprir o horário das atividades profissionais. Logo, logo, apareceu o pai, um homem com seus oitenta anos, todo arrumado com sapato novo, roupa nova, a barba feita, o cabelo bem arrumado. Todos ficaram atônitos com esse visual. O filho pensou: o confinamento pirou meu pai, e foi logo perguntando:

– Por que esse visual diferente, meu pai?

O pai respondeu sem pestanejar:

– Doravante, vestirei minhas roupas novas. Não vou mais passar o dia de calção ou bermuda. Por que em casa temos de ficar com roupas velhas? Agora, aprendi que não temos de usar roupas e utensílios novos só em momento especiais, então, vamos tirar nossas roupas, nossos talheres, pratos e utensílios novos para usar no dia a dia. Além do mais, já vivi muitos carnavais e não sei quantos me restam ainda, então vou aproveitar tudo o que tenho e que está guardado.

O idoso, respirou um pouco e continuou como se estivesse fazendo um monólogo:

– É muita idiotice a gente guardar o que temos de melhor apenas para momentos especiais, momento especial é cada um que a gente vive.

O filho, perplexo, respondeu:

– Meu pai, o senhor tem razão.

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