Colunista Moacir Saraiva: “Mãinha, olhe o velho!”

 

O sujeito ia pela rua todo serelepe com sua barba já não tão escura como outrora, de bermuda, tênis e pisando firme, pensando na vida, mas antenado com os transeuntes que por ele passavam. Ora acenava para um, ora para outro e seguia seu destino.

Acostumado que estava a ouvir a interpelação de conhecidos e desconhecidos, interpelações através de um palavreado que ainda o remetiam a um jovem e isso massageava seu ego, era um vendedor que queria vender algo e dizia:

– Broder, olhe este produto, cai bem em você.

É uma linguagem de jovem para jovem e eles assim se cumprimentam por entenderem que estão na mesma faixa etária e seus mundos serem iguais. E o sujeito que andava pela rua, costumava usar roupas de jovens, sempre de bermudas, às vezes, de camiseta e sempre calçava um tênis de marca e por jovem passava, apesar da barba já com muitos fragmentos que destoavam do preto original e os cabelos da cabeça estarem rareando.

Nesse dia, em que ele desfilava pela rua, ouviu algo não muito familiar a seus ouvidos, nunca ninguém tinha se dirigido a ele usando aquelas expressões. Um vendedor o interpelou da seguinte forma:

– Senhor, por favor, olhe esta mercadoria.

O caminhante se assustou com esse tratamento, pois foi a primeira vez que alguém o chamara de “senhor”. Isso o deixou intrigado e muito, ele se olhou, dos pés até onde pôde se olhar. Ainda surpreso com a indagação do vendedor, se perguntou: – será que estou velho?

Isso o deixou inculcado, mas seguiu caminho, não com a mesma vivacidade de antes da pergunta, pois alguns fragmentos de tristeza o invadiam e algo atazanava seu juízo: estou velho? Não vi nada em mim que anuncie que estou velho, constatou ele. Caminhou mais do que devia, e nessa nova fase da caminhada, não prestava atenção a mais nada, ocupava-se tão somente com a dúvida: estou velho ou não?

Depois de uma hora caminhando, parou em um estabelecimento comercial, sentou à mesa, pediu uma água de coco e bebeu. Seus pensamentos foram se aprumando e ele, enfim, chegou à conclusão de que o vendedor é muito educado e trata todos assim, em sinal de respeito. Ele se tranquilizou e novamente começou a observar os transeuntes. Avistou de longe uma senhora com uma criança caminhando e esta sendo segura por aquela, ele supôs se tratar de mãe e filha. Ele observou que a criança vinha saltitando e sorrindo. Essa alegria foi desaparecendo, à medida que mãe e filha se aproximavam dele, a criança o encarou e se agarrou na perna da mãe, ficou com o semblante triste e piorava mais e mais quando chegavam mais próximo a ele. Ao chegarem bem perto dele, a mãe parou, preocupada com a filha, e esta apontou o dedo para o moço que estava sentado, encarando-o e disse em alto e bom som, mas com a voz trêmula:

– Mãinha, olhe o velho!

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