Colunista Moacir Saraiva: “Estou à Paisana”

Por Moacir Saraiva

Esta expressão é mais utilizada no meio militar e se refere àqueles que não estão usando a farda, entretanto, outros profissionais a utilizam sempre que não se encontram no exercício de suas profissões.

Há profissionais que, pela natureza do ofício, mesmo não estando nos seus ambientes de trabalho, se a situação exigir, ele, incontinenti, veste a roupagem e passa a desempenhar sua profissão, assim acontece com bombeiros, médicos, militares e outros que, na formatura, fazem um juramento para servir à humanidade.

Há pacientes do interior que veem no médico um segundo deus, o que o Dr. fala não se discute, apenas se cumpre. E quanto mais distante dos grandes centros, mais o paciente confia no médico. No sertão do Piauí, em um lugar bem distante da cidade, em que a presença do médico não é tão comum, fruto do descaso do poder público com a saúde da população.

Um amigo médico, ia atender a cada 15 dias nesse lugar, e, em um dia de atendimento, se reapresentou um paciente, com seus 55 anos, e foi lá para levar os exames solicitados. Morador da roça, pequeno agricultor e, como todo interiorano da gema, criava galinha, porcos, um pouco de gado para o consumo, além de manter uma boa horta e plantava, também, árvores frutíferas. Gostava de uma cachacinha e comia, como todo sertanejo, alimentos muito mais para encher a pança do que para nutrir o organismo.

Chegou a vez do sujeito, a atendente o chamou, ele entrou com um envelope bastante recheado e um saco de plástico com três latas de leite ninho. Outra característica do sertanejo é gostar de presentear médicos, levam o que tem de melhor, no caso, o paciente estava levando as latas de leite contendo ovos de galinha da terra para o Doutor.

O sujeito entrou no consultório, desconfiado, como todo sertanejo, bastante acanhado e sem jeito. O médico o recebeu com um sorriso e um aperto de mão caloroso, deixando o paciente mais tranquilo e à vontade. Foi convidado a sentar e depois de bem sentado, falou:

– Dotor, bom dia, eu trusse pro senhor unzovo, taqui, minha muié arrumou direitinho e não quebrou nenhum, já olhei lá fora.

– Muito obrigado pelo presente, disse o médico e acrescentou, não precisava sr. Francisco, é muita gentileza de sua parte.

– Dotor, eu trusse os inzames que o senhor pediu. Me diga, o que tá acontecendo comigo?

O médico analisou os exames do paciente e prescreveu alguns remédios e fez algumas restrições na alimentação. Recomendou que não bebesse bebida alcóolica nenhuma, evitasse comidas gordurosas, farinha e comesse muitas frutas, verduras, carnes brancas.

Após um mês, na festa da padroeira da cidade, estava lá o paciente, em um bar, se empanturrando de cachaça e uma lauta feijoada, muita farinha e bastante pimenta. Estava sentado com amigos, quando aparece o médico e se dirigiu a ele.

– Bom dia sr. Francisco.

O sujeito ficou branco, preto começou a suar e não conseguiu nem se levantar da cadeira. O médico, vendo a aflição do paciente, pegou na mão do sujeito e disse:

– Não se preocupe, aqui estou à paisana.

O paciente sorriu, se levantou, e deu um abraço apertado no médico.

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