Colunista Joice Vancoppenolle: “O néctar da terra santa”

Se você é amante de vinho, o nome Rothschild provavelmente lhe traz boas referências, principalmente em se tratando de vinhos clássicos. E, para muitos, ele é um ícone da grande viticultura francesa, certo? Errado! O barão Edmond de Rothschild é famoso e reconhecido por meio do incentivo à viticultura de um lugar muito querido para ele, ter construído todo um país. E esse país é Israel.

Se vinhos KOSHER é tudo o que você já ouviu falar sobre os vinhos de Israel, está na hora de aprender mais, porque nem todo vinho israelense é classificado como Kosher.

“Naquele dia levantei a minha mão para eles, para os tirar da terra do Egito, para uma terra que já tinha previsto para eles, a qual mana leite e mel, e é a glória de todas as terras.” Ezequiel 20:6

A história de Israel é tão antiga quanto a do homem. São famosas as histórias bíblicas de consumo do vinho. A mais clássica, talvez, seja a de Noé. Em Gênesis 9:20-21, descreve-se como ele foi o primeiro a plantar a vinha e se embebedar, ficando nu dentro de sua tenda. Há muitas referências do cultivo da vinha e produção de vinho em quase todo o país. Abordando o tema mais cientificamente, tudo indica que o mar Negro, o Cáspio e o da Galileia, norte de Israel, foram as primeiras regiões a dominarem a produção de vinho.

Nessa época, já se sabia da devoção dos judeus pelo vinho no desenvolvimento de sua literatura e leis. No Livro dos Números, conta-se que Moisés mandou homens para espionar Canaã. Lá encontraram um cacho de uva tão grande que precisaram apoiá-lo em uma vara, sobre os ombros de dois homens, para conseguir transporta-lo. Há registros arqueológicos de moedas com cachos de uvas gravadas nelas para celebrar vitórias como as de Bar Kochba (136 d.C.) sobre os romanos. As adegas do rei David (1040-970 a.C.) eram tão grandes que havia um oficial responsável por elas.

A adega da Barkan e vinhedos, do Domaine du Castel, de Eli BenZaken, é um dos principais nomes do vinho em Israel.

Dos árabes à “loucura” do Barão Rothschild, à destruição do segundo templo, a dispersão dos judeus da terra e a conquista árabe a partir de 600 d.C. acabaram derrubando a florescente viticultura na terra de Israel. Muito tempo se passou e o século XIX viu algumas tentativas de estabelecimento da vinicultura, como as do inglês Moses Montefiore, dos rabinos Yitzhak Shor e Avrom Teperberg, ambos em Jerusalém. Por volta de 1882, judeus da Europa do leste voltaram para Israel. Por causa da falta de basicamente tudo, os colonos de Rishon LeZion pediram ajuda financeira ao barão Edmond de Rothschild. É aí que a história de amor dele com essa terra começa. O barão decide patrocinar o estabelecimento de muitas comunidades que sejam autossustentáveis. Envia dinheiro e especialistas em viticultura para desenvolver a região. Como as vinhas da Europa estavam sendo devastadas pela filoxera, as primeiras mudas levadas ao país, livres do pulgão, foram importadas da Índia. Plantaram cepas como: Alicante Bouschet, Clairette, Carignan, Grenache, Muscat e Sémillon.

Nos anos 70, estudos mostraram que a região de Golã, no extremo norte do país, era promissora para a produção de bons vinhos. Durante a virada do século, os principais mercados para o vinho israelense eram Rússia e Estados Unidos. Mas, com a Revolução Russa e a Lei Seca norte-americana, a então florescente vitivinicultura do país se viu sem ter para onde exportar. Até os anos 1970, o vinho lá feito era voltado para liturgia. Produzido em grandes volumes, sem interesse maior, doce e feito com uvas não viníferas, a indústria estagnou.

Nos anos 70, estudos mostraram que a região de Golã, no extremo norte do país, era promissora para a produção de vinhos de qualidade internacional. Em 1983, Golan Heights Winery lançou uma primeira série de vinhos de qualidade internacional, desafiando outros produtores a investir na viticultura de alto padrão. As uvas mediterrâneas: Grenache, Carignan, Petite Sirah, entre outras, foram acompanhadas por plantações de Cabernet Sauvignon, Merlot, Sauvignon Blanc, Chardonnay, Riesling e Gewürztraminer.

Muitos israelenses que estudaram em outros países, principalmente nos Estados Unidos, voltaram a Israel, decididos a aplicar seus conhecimentos. Yair Margalit é tido como um dos pioneiros. Professor de química em UC Davis e autor de três livros referência em Davis sobre técnicas de enologia, ele desistiu da carreira de cientista e, em 1989, lançou sua primeira safra. Seus vinhos, da região da alta Galileia, são o cume da elegância do vinho israelense.

Israel é pequeno, mas tem todas as condições dos grandes países para produzir vinhos de qualidade, com uma variedade incrível de microclimas. O extremo norte, em Golã, na fronteira com o Líbano e a Síria, tem clima de altitude, muito ensolarado, com ventos frescos e grande amplitude térmica dia e noite, bem como verão e inverno – quando chega a nevar. Os solos são de basalto vulcânico e tufo, um tipo de calcário firme, mas quebrável, com excelente drenagem. Além de Golan Heights, estão Tabor, Dalton e Château Golan.

A alta Galileia tem clima mediterrâneo, mais seco e mais fresco em altitude, com alguns vinhedos a 800 metros. A poucos metros da costa, região conhecida como Samaria, perto de Zicron Ya’acov, o clima é típico mediterrâneo, com verões quentes e ensolarados. Margalit, Tishbi, Binyamina e parte dos vinhedos de Carmel ficam nessas zonas.

Aos pés das montanhas de Jerusalém, há um clima mais quente, um pouco úmido para a produção de qualidade, mas Carmel, Barkan, Karmei, entre outras, produzem vinhos muito interessantes.

Já nas colinas da Judeia, em volta da cidade de Jerusalém, o clima mediterrâneo é resfriado pelas altitudes e os solos calcários, conhecidos pelas construções da cidade, aparecem bastante. Muitas vinícolas de altíssimo nível como: Castel, Clos de Gat, Flam e Ella Valley, são os destaques indiscutíveis.

Talvez os vinhedos mais impressionantes do país, pela peculiaridade de solos e clima, estejam no deserto do Negev. O verão chega facilmente a 45°C. São vinhedos irrigados com alta tecnologia, onde uvas bordalesas e mediterrâneas dão vinhos ricos, alcoólicos e cheios da personalidade que só vinhedos no deserto podem oferecer. O

grande destaque é vinícola Yatir, que produz um Syrah respeitável, assim como Cabernets e Merlots impressionantes.

Algumas curiosidades

§ Só é permitido produzir vinhos com vinhas de idade superior a quatro anos.

§ Não se pode produzir outros vegetais ou frutas dentro dos vinhedos.

§ Após a primeira colheita, deve-se deixar o vinhedo descansar a cada sete anos.

§ Todas as ferramentas e utensílios para a produção do vinho devem permanecer esterilizados mesmo após a colheita.

§ Uma quantidade simbólica do vinho, representando o dízimo, pago na época do templo de Jerusalém, deve ser jogada para fora dos tanques ou da barrica onde estão sendo produzidos.

§ Quando as uvas chegam na vinícola, apenas judeus observantes do shabat (descanso semanal) podem manusear o mosto, vinho ou qualquer equipamento. Como muitos israelenses não o são, geralmente estas tarefas são realizadas por ortodoxos.

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